Águeda, 1936
O poeta Manuel Alegre recebeu o mais prestigiado galardão das letras lusófonas, o Prémio Camões, em 2017.
Já tinha sido galardoado, juntamente com o fotógrafo José Manuel Rodrigues, com o Prémio Pessoa 1999, uma iniciativa do jornal "Expresso" e da Unisys.
Foi a primeira vez que este prémio, que pretende "reconhecer uma pessoa de nacionalidade portuguesa com uma intervenção particularmente relevante e inovadora na vida artística, literária e científica do país", foi atribuído ex-aequo. Pinto Balsemão, em representação do júri, justificou a escolha do nome de Manuel Alegre, que viu reunida a sua obra poética no volume "Trinta Anos de Poesia" (Publ. D. Quixote), por "ser uma referência da poesia portuguesa deste século" e representar "a visão de um Portugal aberto ao mundo e um humanismo universalista atento a tudo o que nos rodeia".
Manuel Alegre, que poucos meses havia sido consagrado com o Prémio da Crítica do Centro Português da Associação Internacional de Críticos Literários, pelo conjunto da sua obra, a propósito da publicação do livro "Senhora das Tempestades", nasceu em Águeda em 1936 e estudou Direito na Universidade de Coimbra, onde participou ativamente nas lutas académicas.
Quando cumpria o serviço militar em Angola, participou na primeira tentativa de rebelião contra a guerra colonial, sendo então preso pela PIDE.
Seguiu-se o exílio em Argel, onde foi membro diretivo da F.P.L.N. e locutor da rádio Voz da Liberdade.
A sua atividade política andou sempre a par da atividade literária e alguns dos seus poemas ("Trova do Vento que Passa", "Nambuangongo Meu Amor", "Canção com Lágrimas e Sol"...) transformaram-se em hinos geracionais e de combate ao fascismo, copiados e distribuídos de mão em mão, cantados por Adriano Correia de Oliveira ou Manuel Freire.
Os seus dois primeiros livros, "Praça da Canção" (1965) e "O Canto e as Armas" (1967) venderam mais de cem mil exemplares.
Comentando o prémio, em entrevista ao "Diário de Notícias", o escritor afirmava: «"Devo tudo aos meus leitores. É, sobretudo, uma vitória deles. Porque foram os leitores que, ao longo da minha vida literária, estiveram sempre perto de mim e me ajudaram a vencer várias censuras (política e estética). Expresso-lhes a minha gratidão."
Regressado do exílio em 1974, "o poeta da liberdade" desempenhou um papel de relevo no Partido Socialista. Foi membro do Governo, deputado da Assembleia da República e ocupou um lugar no Conselho de Estado, funcionando muitas vezes como uma espécie de consciência crítica do seu partido.
Os livros mais recentes (note-se ainda a incursão pela prosa: "Jornada de África", 1989, "Alma", 1995, e "A Terceira Rosa", 1998) levam-no ao diálogo com poetas de outros tempos, como Dante ou Camões, ou a refletir sobre a condição humana, a morte e o sentido da existência, de que são exemplo os "Poemas do Pescador", que se enfrenta com o enigma da sua vida, incluídos no livro "Senhora das Tempestades",
"Senhora dos cabelos de alga onde se escondem as divindades / (...) Senhora do Sol do sul com que me cegas / (...) Senhora da vida que passa e do sentido trágico / (...) Senhora do poema e da oculta fórmula da escrita / alquimia de sons Senhora do vento norte / que trazes a palavra nunca dita / Senhora da minha vida Senhora da minha morte."
Fonte: Bertrand Livreiros |